Tuesday, May 22, 2007

O tamanho é documento

Outro dos assuntos que urge clarificar, denunciar e resolver é a questão das dimensões faraónica de alguns grupos de investigação.

Saiu hoje no jornal Público uma notícia sobre um investigador português que recebeu um determinado prémio internacional, e na resenha biográfica deste investigador, vem a informação de que ele lidera um grupo científico de mais de 3 dezenas de investigadores. Bem, ou aqui estamos na presença de um milagre da multiplicação da caacidade de orientação, ou é mais um exemplo da (des)orientação que é tão comum em Portugal.

Os grupos de investigação, a partir de um dado número de efectivos, entram em autogestão, em que existem um orientador formal, que na prática não orienta nada, e deopois temos os desgraçadas dos subalternos, como investigadores pós-docs ou alunos de doutoramento mais experintes, que fazem o trabalho de sapa. Uns ficam com o mérito, com o curriculum vitae engordado e com a progressão na carreira docente garantida, e com mais cacau no bolso ao fim do mês, e com mais notoriedade nacional e internacional, e com mais possibilidades de ganhar novos concursos e maiores perspectivas de eternizar a exploração... E os outros ficam com a "experiência", e com a batata de se verem nelas se o trabalho dos alunos der para o torto...

Pois é, e se isto me parece incorrecto, mais ainda me parecerá se verificarmos que o Estado, que é quem financia este estado de coisas, sabe da situação e, espante-se, apoia!, pois concede bolsas a mais alunos para entrarem neste carrossel. Um "bom" chefe, aqueles dos estímulos à excelência, é o que orienta trezentos milhões de alunos, no papel, bem-entendido. Um bom chefe é aquele cuja produtividade científica seja de dezenas de artigos por ano, mesmo que nem tenha passado os olhos por eles, ou não perceba um caracol sobre a temática tratada. Um bom chefe é que aquele que aparece na televisão a dizer as maiores barbaridades, evidenciando total desconhecimento e ignorância, mas fazendo um brilharete. Um bom chefe para o Estado, é o pior chefe que se consiga imaginar, cientificamente falando.

Eu acredito que não é possível orientar mais do que 4 a 5 alunos de doutoramento, mantendo actividades docentes e coordenação de projectos. E se calhar sou optimista. Conheço eminências com 8 alunos de doutoramento, e com a responsabilidade acrescida de coordenar 3 projectos nacionais, 1 europeu, e ainda dar 370 horas de aulas anuais. Ora, isto é evidente que algo ficará por fazer, para além da mera perda de qualidade de qualquer uma destas funções. Não é humanamente possível fazer tudo isto, tão simplesmente. E o Estado paga, e continuará a pagar.

A FCT tem coisas engracadíssimas, nomeadamente no que diz respeito ao regulamento de avaliação de projectos. Existe um tecto de disponibilidade acima dos quais nenhum investigador pode estar adstrito. Nenhum investigador pode estar em mais do que 50% do seu tempo, assumindo que os restantes 50% são destinados a actividades docentes, em projectos da FCT ou similares. Pois bem, pessoalmente conheço investigadores adstritos a mais do que 150%, só em projectos nacionais!!! De quer serve regulamentar se não se fiscaliza? De que serve concorrer quando o próprio sistema serve para permitir estas coisas?

Escândalos não faltam...

1 comment:

Rodrigues Moura said...

Pois é… lá começamos nós a colocar o dedo na ferida! De facto é de conhecimento público (e basta pesquisar na base de dados da FCT, agora com a banda larga é bastante rápido, asseguro-vos), pelo menos para os mais atentos, o “pool” de iluminados (ou talvez “sobredotados”) que o nosso país à beira mar plantado tem! São os famosos professores de carreira (na maioria catedráticos, e desculpem-me a clareza de espírito…), que vulgarmente emprestam a caneta para que os seus súbitos possam redigir projectos e teses em que eles próprios, muitas vezes num acto aparentemente estóico, colocam o seu cunho e a sua pseudo-sapiência. E é assim que engordam habilmente os seus curricula, num mecanismo que eu apelido de “efeito de bola de neve”. Chega a altura de dizer basta! Chega a altura de denunciarmos todas as situações que limitam a equidade académica entre investigadores juniores e seniores (estes últimos só de idade). Todos temos ambições, legítimas e batalhadas, de querer chegar mais longe sem que tenhamos o corpo parasitado pelos velhos do Restelo. Mas não basta falar nos problemas. Temos que em consciência e no dia-a-dia lutar contra a intimidação dos apelidados chefes, orientadores e directores de laboratório. Temos que mostrar sermos capazes de ultrapassar as barreiras da ignorância e intimidação e deixar de trabalhar para as medalhas… dos outros. Já dizia o poeta que só se vive uma vez… e o tempo urge.

Rodrigues Moura