Thursday, May 15, 2008

Debate

Meus caros amigos, o que eu acho é que não vai haver empregos se não houver carreiras. Veja-se o caso dos professores do ensino secundário. o Estado forma gente para o desemprego. Como não é isso que eu defendo, acho que este assunto merece debate.

Vejamos: a estratégia é "doutore-se o maior número possível de indivíduos", mesmos nas condições mais precárias, sem que haja verdadeiros interfaces entre ciência e indústria, ou ciência e sociedade civil, ou ciência e tecido produtivo ou agentes económicos (já para não falar de um elo verdadeiro e franco entre ciência e universidade), e depois tenta forçar-se esta gente toda, caríssima ao Orçamento Geral do Estado e aos sucessivos programas (FEDER, POCTI, POCI), a emigrar ou a criar a sua própria empresa. Isto é completamente absurdo, porque não há uma política de efectivação deste desígnio do Estado. A AdI, por muitos esforços que teça, não consegue de modo algum incluir tantos doutores nas empresas, por culpa tanto das universidades e centros (que nunca deram um verdadeiro exemplo de trabalho, porque foram durante décadas meros praticantes do funcionarismo público mais primário), como também das próprias empresas, que querem é subsídios e benesses, e isenções fiscais, e baixos salários, e pouca qualificação - modelo estafadíssimo de desenvolvimento económico, que começou há cerca de 3 a 4 anos a mostrar as suas enormes fragilidades.

Um país pobre, com défices culturais gigantescos, em que o emprego se rege por regras ainda de feudalismo puro, saído de 50 anos de ditadura fascista, que tudo castrou e nada formou, sem bases tecnológicas e científicas sólidas, em que o carreirismo universitário público foi símbolo de status, será que é possível mudar por decreto e por formar longas listas de doutores? Um país com uma indústria incipiente, sem espírito empreendedor, com devaneios de império adiado e faduncho, com tendências para alucinações futebolísticas colectivas, como se transforma isto num lar para cientistas? Sem que se resvale para a sacanice, para o esquema mafioso de bairro, sem permitirmos benefícios ilegítimos e abusos de todo o tipo? Este país não está preparado para a Ciência, e a comprová-lo temos os números do desemprego por sobrequalificação. Por isso acho que não podemos, num prazo de 10 a 20 anos, regermo-nos por ditames meramente comparativos e estatísticos, utilizando como termo a União Europeia, onde pontificam colossos como o Reuno Unido, a França, Holanda, Alemanha e Países Nórdicos. Ambição, sim; cegueira, nem pensar. E muito menos esta tentativa absurda de nos colocarmos em bicos de pés para podermos aceder a bailes que não são nossos. Isso é viver acima das possibilidades.

Eu não estou preocupado com o meu emprego daqui a 5 anos, mas se eu não tiver perspectivas de o ter, porque ele tem tendência a desaparecer (como no caso dos investigadores auxiliares - até já tenho conhecimento de directores de LAs que pensam em demitir-se porque não conseguem cumprir com os compromissos salariais já assumidos... circulam mails azedos entre directores desses LAs pelo facto de a FCT não desbloquear verbas para pagar aos funcionários... esta é que é a realidade), não acham que devo ficar preocupado? É exactamente essa perspectiva do horizonte temporal limitado que eu condeno, a preocupação imediatista com o meu umbigo, que "pelo menos durante os próximos 48 meses está garantido". Esta é a conversa que costumo ouvir aos bolseiros, mas os na casa dos 20, porque os na casa dos 30, com verdadeiras responsabilidades (familiares, por exemplo) já falam de forma diferente.

Ninguém daqui sai ileso, porque há culpas de todos os lados, e parece que existe muito pouca vontade de tanto ministério e ministro, como bolseiros, como docentes, como empresas, as quererem assumir. Sem fatalismos, sem dramas, sem culpas a serem arremessadas de parte a parte, hoje urge resolver esta situação. Não é deitando preocupações para trás das costas que se resolvem os problemas, deliberadamente evitando pensar o que vai acontecer daqui a 5 anos, esperando que o mercado regule a empregabilidade (essa é a maior falácia de todas, porque num sistema corrupto como este, a qualidade será sempre o menor dos argumentos para dar emprego seja a quem for). Eu também já tive a ilusão de que os bons seriam recompensados, mas isso para mim é fé, é do domínio do divino. E como eu não sou homem de fé, bem pelo contrário, acho que é pelo debate e pela construção das coisas que lá chegaremos.

E havemos de chegar a algum lado, isso vos garanto. Nem que seja pelo simples facto de que é impossível estarmos pior.

1 comment:

Filipe said...

Caro André: cabe a nós, os mais jovens e com boa formação, DENUNCIAR todos os casos de corrupção e compadrio que ocorram na função pública e de que tenhamos conhecimento !! Cabe a nós contribuir para formar-mos um país mais desenvolvido e menos corrupto.