Monday, May 24, 2010

Contentes estamos nós todos...

Anda o Sr. Ministro contente, e nós também deveríamos ficar contentes: quando o Ministro dos cientistas se alegra, deve ter razão bastante para tal. Pois, mas isso seria num país à séria, não aqui nesta enxovia intelectual.

Então não é que publicámos logo aos 7 mil papers de cada vez? Campeoníssimos, é o que somos todos, uns verdadeiros exemplos de como do quase nada fazer muito. Então não é que um país que não investe nos seus jovens cientistas consegue ter aumentos explosivos (Ministro dixit) do número de publicações? Isto até parece um contrasenso sindical: "Ministro, daí-nos fome e nós trabalharemos ainda mais". Se o raio da moda pega...

Pois bem, veneno aqui vem ele. Este é o País das idiotices, e é deste pressuposto que parto para mais esta análise crítica. Os bolseiros, justiça lhes seja feita (palavra de ex-bolseiro, que aqui me confesso), são os grande obreiros deste trabalho. Eu cá escrevo projectos e artigos, e partilho de forma pouco equitativa o trabalho prático com os meus colegas assalariados da FCT. Fico triste, mas cada vez menos ponho a mão na massa... Talvez até dissesse "servos da gleba" da FCT, caso não achasse que feriria susceptibilidades. E são estes obreiros que andam desde 2002 a ganhar o mesmo, que por manifesta paixão e abnegação (pelo menos a maioria, os da "família" de um post anterior não contam para estas estatísticas) ainda se dedicam às lides do laboratório. Paixão assolapada, pois é impossível fazer isto por outro motivo que seja. Dinheiro? Nunca, nunca se ganhou tão mal na Ciência como hoje; segurança? Não, essa é para as cátedras, ou, vá lá, de associado para cima; Vaidade? Também não creio, quem é vaidoso quando passa fome? Então algo vai profundamente mal neste pequeno reino, quando um Ministro publicamente assume que está a ministeriar uma horda de competentíssimos profissionais, que pouco mais recebem no fim do mês do que pipocas. Tanto fogacho, mas tão pouco cacau. E não é com foguetório, Sr. Professor do Técnico, que se pagam as contas da luz. Mas o Senhor sabe, aliás não saberemos todos?

Portanto, não consegue esta notícia da suposta felicidade do Sr. Ministro arrancar-me mais do que um leve sorriso cínico. De quem continua a ver uma caravana de perfeito feudalismo a avançar por rotas neoliberais, e a navegar num mar instável que se encapela a cada sopro. Isto está a chegar ao escolho, e quando um dia o casco bater no fundo, teremos sempre os mesmos usurários da desgraça alheia a vociferar que o País é pequeno, inculto, pobre, atrasado, que nunca cimentou um verdadeiro sistema científico, que as empresas não têm dimensão para investir em Ciência, que temos de aproveitar é o Sol e o Mar... já quase parece conversa de Zézé Camarinha, mas a esse não lhe pagam para mandar no País, pois não? Mais vale fecharmos a tasquinha para balanço, despedir todos os cientistas de vez, saldar as dívidas para com fornecedores, e de uma vez por todas assumir que isto de fazer ciência em Portugal foi uma miragem, ou um sonho de uma noite de Verão. Efémero e leve. Mas que
ao menos não sirva para engalanar as naus, ou para fazer boas figuras. Todos sabemos quão desagradável é a realidade.

Ainda vamos a tempo, honestamente acredito, mas não é com solidariedade bacoca e da treta que ganhamos a confiança das pessoas, cientistas e bolseiros incluídos. As pessoas precisam de reconhecimento "cifrónico". E de outras coisas, que falarei na próxima oportunidade. Não acha, Sr. Ministro?

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