A questão das avaliações é de todo pertinente, e talvez seja o assunto mais pertinente que me ocupa presentemente. Sem aferição da qualidade não será nunca possível melhorar, nem estabelecer patamares de justiça, nem distinguir os "enchedores de chouriços" das mentes criativas. E esta é daquelas discussões que creio fazer hoje todo o sentido e cada vez mais, pois a competição e a competitividade fazem com que seja necessário instituir ferramentas objectivas, idóneas e imediatas de conhecer e reconhecer a qualidade de quem faz (ou diz que faz) Ciência.
O critério da publicação é de facto incontornável. Por muito que eu possa objectar, e decerto que muitos objectarão, a questão de sermos reconhecidos pelos nossos pares, permitindo-nos aceder à internacionalização, é dos critérios mais importante no processo da avaliação dos investigadores. É natural que toda a gente conheça os autores da "Ciência a metro", do "muda o bicho e publica o mesmo", dos "chouriços" e de toda essa parafernália de instrumentos de abuso com que alguns vão ludibriando as intenções primárias dos avaliadores. Apesar de eu tender a somente reconhecer publicações em revistas internacionais com avaliação pelos pares e naturalmente indexadas, tenho de reconhecer tacitamente a falha deste sistema. Porque também todos deveremos conhecer exemplos de conversas de corredores em que alguém diz que publica sem dificuldade devido ao facto de ser amiga íntima do editor da revista X ou Y. Mas como não existem sistemas perfeitos, e este apesar de tudo não é totalmente imperfeito, eu vou aceitando-o, na convicção de que a avaliação do desempenho não se faz só por aqui.
Mais parâmetros de avaliação:
O número de alunos em orientação ou co-orientação. O número de citações das publicações, e o seu factor de impacto (normalizado para a área científica em questão). O sucesso ou insucesso das teses de doutoramento, com avaliação das taxas e motivos de desistência (para excluir casos de despotismo que todos ouvimos falar). O tempo que leva, em média, a que alunos de doutoramento obtenham o grau, de modo a evitar aproveitamentos ilegítimos por parte dos orientadores sem qualidade. O número de patentes obtidas. O número de projectos submetidos e financiados a entidades tanto nacionais como estrangeiras. O número de projectos em consórcio com empresas (porque isto de ser cientista não é um mero exercício de vaidade pessoal, há que dar de comer a alguém). A qualidade da tecnologia desenvolvida e transferida, de facto, para o tecido empresarial. O número de actividades de divulgação científica. O número de participações em congressos internacionais. O número de convites para integração de entidades nacionais ou internacionais, para actividades de consultadoria ou expertise. A qualidade das participações em processos de tomada de decisão para o bem público. No fundo, a qualidade da contribuição da ciência produzida que seja útil, para além de boa.
O que eu acho é que não existirá nunca qualquer processo de avaliação credível que funcione sem penalizações para quem infrinja as regras. Não consigo conceber que:
a) não haja um processo de avaliação instalado e a funcionar, em termos nacionais
b) quem não tem qualidade, não seja denunciado pelos seus pares; sabemos que as instituições são avaliadas no seu conjunto, mas expulsões de membros parasitários são raras ou até excepcionais, para não dizer extraordinárias ou inexistentes
c) não haja o afastamento de elementos corruptos e/ou corruptores, com base na assinatura de uma carta de ética, que congregue os valores de uma sociedade minimamente democrática, e leal; os incumprimentos deveriam ser sinónimo de afastamento da possibilidade de usufruir de fundos públicos, por um período a definir
d) continue a haver este espírito corporativo doentio e estático, que beneficia os maus, não prejudicando contudo os bons; só prejudica os excelentes, que vão sendo progressivamente asfixiados por cátedras e conselhos científicos que se opõem, regra geral, à mudança
e) não haja, da parte do Estado, um corte radical neste processo de claro retrocesso, com a instauração de uma prática coerente de costumes; temos fiscalizações quase inaceitáveis da esfera privada, mas aquilo que determina a qualidade da coisa pública nem sequer é objectivamente avaliada.
Para concluir, sem moralização e branqueamento ético nunca haverá qualquer processo de avaliação do desempenho que seja sustentável. E por uma razão simples: as regras mudarão sempre que for conveniente premiar alguém, por muito fraco que seja. Exactamente por isso é que me bato intransigentemente por este objectivo.
Monday, March 24, 2008
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1 comment:
Existem hoje em dia em Portugal grupos de investigação onde a "ciência" é feita em autênticas linhas de montagem de produção de artigos. Em resultado surgem muitos artigos com elevado número de autores quando um 1/2 ou mesmo 1/3 desse número de autores teria sido provavelmente suficiente. Penso por isso que critérios mais justos de avaliação terão de ter em conta também o número de autores. Um critério que me parece mais justo consiste em calcular os quocientes (I.F / N.A) onde I.F. é o "Impact factor" do jornal e N.A é o "Número de Autores" do artigo.
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