Monday, March 31, 2008

Para a frente é que é o caminho

Pois é, e está chegado o tempo de falarmos de soluções. Soluções para lutar contra este estado de coisas. Gostaria assim de congregar, sob um mesmo chapéu, todos os cientistas honestos. Os outros estão nas cátedras... e noutros sítios.

Muitas vezes, no decorrer de discussões mais ou menos acaloradas com os meus colegas docentes e bolseiros, depois de uma sessão em que carpimos todos as mágoas e estabelecemos todas as comparações deste panorama com o fascismo, surge invariavelmente a questão: "mas afinal o que é que nós podemos fazer?"

A primeira coisa é debater estes assuntos. Sem haver a certeza de que isto é generalizado, de que a corrupção se instalou, de que existe falta de qualidade em muitas das nossas vacas sagradas que invariavelmente aparecem na televisão, então nunca poderíamos concluir que temos um problema. Qualquer participante de grupos de discussão de problemas sabe que o primeiro passo para a sua resolução é assumirmos que estamos, de facto, em luta com um problema. Creio ser já ultrapassada essa fase, pois a seriedade da questão do atraso estrutural do nosso país em termos científicos é flagrante.

Depois, o segundo passo consiste, na minha opinião, na denúncia de alguns casos demasiado escandalosos para passarem impunes. E quando falo de denúncias falo ao mais variado nível: quanto tiver acesso a casos documentados de corrupção (e acreditem que é só uma questão de tempo até os termos) farei uma exposição ao Senhor Procurador Geral da Républica, Dr. Pinto Monteiro. Ou isso ou enviarei um envelope cheiinho e gordinho à Polícia Judiciária, e caso fique com a sensação de que não hÁ desenvolvimentos satisfatórios, enviarei cópia à comunicação social. Infelizmente, e aqui falo com experiência própria, a comunicação social em Portugal aprecia escândalos de futebol, de costumes, de sexualidade alegadamente desviante, de corrupção nas obras públicas e problemáticas de fundo de danças de cadeiras parlamentares, como viagens fantasma e afins; já sugeri a vários órgãos de comunicação social que façam investigações sobre a temática da corrupção na ciência, e inclusivamente predispus-me a dar dados que lhes faciliariam o processo, e até hoje nada! Mas não desanimei, naturalmente, pois o objectivo de trazer à barra as malfeitorias de décadas, e as consequências inestimáveis e incalculáveis para este País que daí advieram, são de extrema importância.

Outra resposta assenta na organização de um processo de resistência informado. Se estas dicussões não são tidas, se os alunos que ingressam na investigação não sabem o que se passa, temos aqui terrenos férteis para a instauração de um ditadura subterrânea, de silêncios comprometidos. Obviamente, este último ponto conta com a vontade de as pessoas em serem informadas; conheci muita gente que preferia viver na ignorância do que ter conhecimento e ter de tomar uma atitude. Eu sinceramente acredito que é preferível saber, do que não saber, com eventual sacríficio no nosso bem-estar e do nosso tempo. Mas será que estaremos todos dispostos a perder a face todos os dias, e a sermos vigarizados com os argumentos mais absurdos que visam somente beneficiar sempre os mesmos? Não tenho muita afinidade para fazer figura de parvo...

Torna-se hoje absolutamente necessário criar um movimento de fundo que exija mobilização. Mobilização de docentes, de bolseiros, de investigadores, de técnicos, de todos os que, directa ou indirectamente, estão envolvidos nisto de fazer Ciência de forma honesta. E este movimento de fundo terá de servir para exigir, junto do Estado Português, que audite contas de projectos, que exclua prevaricadores e vigaristas, que faculte critérios de seleccão de paineis de avaliadores, que explicite muito bem quais os mecanismos que permitiram que um dado júri tenha sido responsável por esta ou aquela avaliação. Para por fim à promiscuidade. Depois, temos igualmente de exigir ao Estado Português que tenha a frontalidade e a decência de deixar de patrocinar ad eternum e sem discussão as iniciativas de autopromoção pessoal das vacas sagradas, nomeadamente por intermédio dos órgãos de comunicação social sob a alçada da tutela pública. Quem conseguirá conceber, no seu perfeito juizo, que um físico detenha um espaço de discussão pública, na televisão do Estado, sobre biologia? Por muito respeito que eu queira ter pelas pessoas, não consigo tê-lo quando vejo uma ascensão mediática meteórica por vezes baseada em pouco mais do que uma série bem encadeada de lugares comuns.

Mais sugestões... dou amanhã

2 comments:

Filipe said...

Concordo no geral consigo. No entanto quando fala do físico e admitindo que se refere a Alexandre Quintanilha aí já não concordo consigo. A ciência é cada vez mais interdisciplinar e não me surpreende nada que um físico se torne figura importante em biologia. Penso aliás que a Física tem muito mais a ver com a Biologia do que tem o estudo dos calhaus !!

Brotero said...

O Alexandre Quintanilha está onde está por razões que ultrapassam a Física ou a Biologia. É bom, irmãos, de se ver quais...